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Amigos


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Um famoso monarca da Antiguidade condenou à morte um homem. De nada valeram as lágrimas do condenado nem de seus parentes e amigos para con¬seguir do duro tirano o perdão.

O condenado ponderou então ao rei:

- Sei que não quereis comutar minha sentença.

Concedei-me, porém, um último favor.

- Exceto a vida, respondeu' o tirano, concedo-te desde já tudo que me pedires.

- Sou casado e tenho filhos. Preciso regularizar meus negócios antes de. morrer, para que não deixe minha mulher e meus filhos em difícil situação financeira.

- Ah! Mas isso que me pedes é impossível de conceder, retorquiu o rei.

- Impossível? Lembrai-vos de que jamais faltei à minha palavra. Quero apenas dez dias de liberdade. Se atenderdes ao meu pedido garanto-vos que antes de esgotar o prazo estarei à vossa disposição.

- Não; repito que é impossível conceder tal favor.

- E se eu encontrasse um amigo que ficasse em meu lugar e que empenhasse a cabeça pelo cumprimento de minha palavra, dizei-me se me concedereis a licença solicitada.

- Se achares tal amigo, concedo não apenas os dez dias que pediste, mas vinte.

Naquele mesmo dia, enquanto o condenado caminhava na direção de sua casa e de seus negócios, tomava seu lugar na prisão, garantindo com a cabeça a sua volta, um amigo dileto.

Passaram-se os dias. Na véspera do término do prazo não retomara ainda o condenado.

No vigésimo dia tudo se preparou para a execução e todos já imaginavam que aquele bom amigo ia pagar caro sua dedicação. Admirou-se o monarca ao entrar na cela do substituto generoso, de encontrá-lo cantando, satisfeito, confiante.

- Sabes que dia é hoje? perguntou-lhe o monarca surpreendido. .

- Sei, perfeitamente. É o vigésimo dia da partida do meu amigo.

- Sabes para que hora está marcada a execução?

- Para as doze.

- Sabes finalmente que horas são?

- Creio que já soaram as onze.

- Não tens medo da morte?

- Por que temê-la se não vou morrer?

- Como? Pensas então que eu te vá perdoar?

- Não! O que eu sei com certeza é que meu amigo chegará antes das doze horas. Podeis estar certo, ele virá.

O rei contemplou abismado aquele homem de fé inabalável e ficou silencioso algum tempo.

Ao soar a hora fatal o substituto foi conduzido ao lugar onde lhe cortariam a cabeça.

O soberano perguntou:

- Ainda esperas?

- Ainda e sempre.

O carrasco já afiava na pedra o cutelo para cortar a cabeça do amigo fiel quando ressoou nos ares um grito:

- Suspenda-se a execução.

Era a voz de um homem ofegante de cansaço que rompia a multidão desesperadamente.

Era a voz de um homem de palavra que tinha um amigo fiel.

O soberano abaixou a cabeça pensativo, edificado de ver um condenado cumprir a sua palavra, voltando a tempo de impedir o sacrifício do amigo sincero. Pôde ver ainda o condenado, num abraço, agradecer a confiança daquele que se oferecera para tomar-lhe o lugar na prisão.

Dirigindo-se ao soberano o condenado falou:

- Obrigado, obrigado. Agora podeis mandar cortar a minha cabeça.

- Não. Estou disposto a perdoar, mas sob uma condição.

- Dizei-a.

- Éreis até agora dois bons amigos. Doravante seremos três.



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