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O julgamento de Sócrates
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O julgamento de Sócrates foi relatado por seu discípulo, Platão, no livro Fédon, e apesar de ter sido realizado há mais de 2.400 anos, aborda, em sua essência e nos fatos que o rodeiam, temas e questionamentos que até hoje procuramos compreender.O ponto de partida para tentar compreender tal julgamento está na defesa das acusações que foi feita pelo próprio Sócrates. Uma vez que não havia pessoa melhor para demonstrar a veracidade dos fatos, se não aquele que os praticou/vivenciou. A partir desse ponto de partida, podemos entender a grandiosidade que esse julgamento tem não só para a história da Filosofia, como também para a história da humanidade. O saber, a missão e a mortePelo entendimento do texto, o Saber para Sócrates estava diretamente ligado à humildade ? uma das virtudes que demonstra o grau do caráter humano ? em reconhecer à limitação do conhecimento. Podemos ver isso quando Sócrates parte atrás de pessoas que - supostamente - sabiam mais que ele, e chega à conclusão de que, apesar de realmente saberem acerca daquilo que estão acostumados a lidar, não sabiam acerca daquilo que não dominavam e, assim, pensavam - erroneamente - que sabiam, não assumindo, desta maneira, a verdade. Ainda, o ?Saber de Sócrates? (por assim dizer) estava na capacidade de assumir a verdade: saber que de nada se sabe. Uma vez que o conhecimento/sabedoria só é atingido através da verdade.De forma tranqüila e sem receios, Sócrates expõe sua Missão aos presentes no julgamento. Relata como o Oráculo de Delfos o qualificou como o mais sábio dentre os homens e como procedeu para buscar respostas para comprová-lo. Sócrates buscava a perfeição da alma, mas sabia que para atingi-la só mesmo através da verdade. Não que ele não acreditasse no Oráculo ? manifestação divina na Terra ?, mas não compreendia o motivo pelo qual o levou a dizer aquilo. Paralelo a esse questionamento, o filósofo começou sua busca por aqueles que tinham todo o estereótipo de um sábio: conhecimento a certa de todas as coisas. Para o filósofo foi mais fácil entender porque aqueles a quem procurou (políticos, poetas, artesãos) não serem os escolhidos do Oráculo: não possuíam a humildade em reconhecer que não sabiam acerca daquilo que não dominavam.Como supracitado, Sócrates buscava a perfeição. Perfeição essa que só era possível através da verdade. Para ele, não era possível chegar à perfeição através da política, pois a mesma não busca a verdade e, sim, a justiça. Com certeza, tal pensamento foi decisivo para condená-lo; visto que nem todos possuíam seu grau de conhecimento, não puderam compreender que a justiça dita por Sócrates não buscava a verdade e sim culpados e inocentes, mesmo que não utilizassem da mesma.A morte anunciada (como condenação a seu julgamento) deveria despertar naquele homem o mais temível dos sentimentos e a mais insensata das manifestações, mas, surpreendentemente, Sócrates demonstra, mais uma vez, o grau de sua sabedoria. Supôs (até aqui ele mostrou que não sabia de tudo, apenas supôs) que havia dois caminhos para seguir: a morte instantânea ou o renascimento de sua alma (consciência). Ele estava tranqüilo por que sabia que, além de ter falado a verdade, não foi ela - nem si mesmo - quem o condenou, mas sim a ignorância daqueles que não admitiram que foram falhos em condená-lo. Dizer isso a todos seria o mesmo que repetir sua defesa na íntegra; portanto, desnecessário. Com certa margem de erro, é possível dizer que Sócrates sabia de sua morte quando, no decorrer do julgamento, observou que ali dentro a verdade não valia de muita coisa.A autonomia dos temas neste julgamento é observada quando o Saber de Sócrates provoca uma reação contrária ao que ele propunha, ou seja, ?saber que nada sei? para aqueles que o julgavam foi mais uma prova de que ele se julgava superior demais para estar ali; sua Missão é encarada ? de forma errada ? como uma prova de que utiliza-se da retórica para escapar da condenação; e sua morte parece ser eminente, pois satisfazer a vontade do povo é o que conta numa democracia como Atenas, mas a vontade de poucos influenciou a maioria.Há uma correlação entre os temas, principalmente entre o Saber e a Missão. Pois o segundo é uma busca pelo primeiro e o primeiro é uma conseqüência que Sócrates tira do segundo.A Morte como condenação deixa um grande significado: o primeiro, por si só, que é seu exemplo de morrer para deixar vivo aquilo em que acreditava e conseqüentemente um recado aos sofistas de que deveriam não só se preocupar com a oratória, mas também com a verdade, pois a aplicação da primeira sem buscar a segunda não é filosofia.O que deixa mais intrigada a leitura desse texto foi o fato de que Atenas, sendo uma cidade "democrática", levou à morte seu filho mais ilustre por fazer justamente aquilo que a democracia mais defende: liberdade de expressão. Poder-se-ia, até mesmo, dizer que o único crime que Sócrates cometeu foi o de ter sido ateniense até o fim, literalmente.
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