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As estruturas elementares do parentesco
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Freud fala-nos de desejos que nascem conosco e que, para que vivamos bem em sociedade, são reprimidos, reforçando a oposição entre natureza e cultura. Entre esses desejos, encontra-se o do incesto. De acordo com as descobertas desse pensador, as crianças já nascem com instintos sexuais e os pais são os seus objetos de cobiça. Com o objetivo de explicar esses desejos incestuosos reprimidos, Freud utilizou-se do mito de Édipo. Para as pessoas de nosso tempo não há muitas novidades nessas afirmações, pois vamo-nos familiarizando com essas idéias desde que começamos a ter entendimento do mundo que nos cerca. Na época em que elas foram formuladas, entretanto, causaram espanto, já que os indivíduos eram acostumados a pensar nas crianças como seres ?inocentes?, desprovidos de sexualidade. Além disso, talvez por motivos religiosos, talvez porque o homem sinta necessidade de diferenciar-se dos outros animais, o incesto sempre fez parte dos conteúdos sobre os quais não se deseja tomar conhecimento, já que, para viver livre do peso dos pecados, o indivíduo deve voltar-se mais para as questões do espírito, afastando-se da animalidade. Observando-se a trajetória da humanidade no decorrer dos séculos, bem como os registros de ordem histórica e artística, percebe-se que o incesto possui a particularidade de causar horror e despertar a curiosidade simultaneamente. Vários estudos antropológicos demonstram que essa questão vem provocando a preocupação dos homens, no decorrer do tempo, nas mais diversas culturas. Percebe-se que há uma tendência, em quase todos os povos e culturas, a uma certa aversão ao incesto, o que nos remete à universalidade de tal sentimento, ao mesmo tempo em que observamos certas regras que fazem com que pensemos tratar-se de algo proveniente da cultura. Em As estruturas elementares do parentesco, Lévi-Strauss afirma que o ponto de partida para o estudo da proibição do incesto é a distinção entre natureza e cultura, o que não é fácil de estabelecer, pois, ao tentarmos, esbarramos na impossibilidade de determinar o que seja natureza. Por mais que tentemos observar de forma natural a evolução de uma criança, isso sempre ocorrerá artificialmente, essa análise sempre sofrerá a influência da cultura. Além disso, não há registro de um comportamento pré-cultural que se pudesse utilizar como comparação à conduta de uma criança observada. O único critério seguro para diferenciar natureza de cultura é a ausência de regras da primeira. Tudo o que é universal, no homem, decorre da ordem da natureza e tudo o que está submetido a uma norma pertence à cultura. Para Lévi-Strauss o impedimento ao incesto pertence simultaneamente ao âmbito da natureza e ao da cultura, ou seja, a proibição desse instinto apresenta caráter contraditório: por um lado é cultural por constituir-se em uma regra, por outro é natural por possuir universalidade, já que encontramos essa interdição em todos os grupos sociais, ainda que cada um determine as próprias regras. Georges Bataille concorda com Lévi-Strauss no que se refere ao caráter universal do impedimento ao incesto, mas afirma que a forma pela qual essa proibição acontece varia de sociedade para sociedade, isto é, o que é motivo de interdição em uma determinada cultura não o é obrigatoriamente em outra e vice-versa. Se, conforme acredita Lévi-Strauss, o horror ao incesto representa a passagem da natureza para a cultura, essa seria a forma de nos distinguirmos dos demais animais, colocando-nos em oposição a eles, da mesma forma que natureza opõe-se à cultura. A experiência humana nos tem demonstrado que não existe possibilidade de luta vitoriosa contra nossos instintos, nada podemos em relação à sexualidade, a não ser reservar campos nos quais a atividade sexual não possa entrar. Os relacionamentos consangüíneos remetem-nos à questão da busca de explicação para a própria existência. A criança imagina as relações sexuais entre seus pais, tentando assim dar uma resposta ao enigma de suas origens. Dentre todos os tipos possíveis de relação incestuosa, acredita-se que o ato amoroso entre mãe e filho possua um elemento simbólico a mais, a relação sexual entre filho e mãe pode representar um retorno ao útero materno e, portanto, às origens. Analisando a história de Édipo e Jocasta, Lévi-Straus concluiu tratar-se de um mito da origem. O próprio trajeto circular feito por Édipo mostra um regresso do herói ao seu ponto de partida. O filho de Jocasta nasce em Tebas, é levado para o Monte Cíteron e após para Corinto, depois de crescido vai ao Delfos tomar informações sobre a sua filiação. Sabendo que matará o próprio pai e desposará a mãe, foge sem saber que começará a cumprir o seu destino no meio do caminho. Chega ao Monte Ficeu, onde resolve o enigma da esfinge, ganhando o direito de tornar-se rei de Tebas, para terminar de cumprir a profecia e contrair matrimônio com a própria mãe. Aqui se observa um retorno às origens, tanto na volta de Édipo a sua terra natal, quanto no fato de ter-se casado com a mãe. Esse círculo só é rompido com o exílio e com a morte de Édipo. Também na análise estrutural desse mito juntamente com outros relacionados, Lévi-Strauss descobriu vestígios da busca humana pelas origens. Há dois pontos de tensão no mito, um entre a conservação e a destruição das relações de parentesco e o outro entre a negação e a afirmação da animalidade humana, temas que remetem a uma angústia a cerca da origem.
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