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Sociedade, Estado e Razão
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1- A teorização hegeliana do Estado e da sociedade civil deve ser compreendida pela necessidade de uma explicação racional que legitime o direito de pedir aos cidadãos o sacrifício dos seus bens, através do pagamento de impostos, e mesmo da vida, em caso de guerra, uma vez que o Estado é erigido em defensor soberana da vontade dos seus súbditos. 2- Ao apontar o Estado como o ?racional em si e para si?, Hegel antevia a reconciliação do Universal e do Particular, a superação do conflito entre as vontades particulares pelo Estado. Porém, esta argumentação leva-nos a encarar o Estado como um instrumento de um sector da sociedade para coarctar ou até negar a liberdade, já que é encarnação da vontade do todo e é no Estado que se diluem as diferenças. O sistema hegeliano despoletou dois tipos de reacções: a) A ideia marxista de extinção do Estado, em que a sociedade civil será superada por uma sociedade sem classes. Como as instituições políticas vigentes no mundo moderno garantem apenas os interesses da classe dominante, elas contêm os germes da sua própria extinção. b) A tradição liberal, propondo a redução do Estado na sociedade civil, pressupõe uma harmonia entre a liberdade e a organização social, remetendo o Estado para funções de vigilante e garantia de livre circulação de ideias e bens materiais.
3- Os efeitos conjugados do desenvolvimento industrial, da igualitarização e da recusa da tradição e da transcendência serão lidos por Max Weber como um processo de ?racionalização? progressiva. O processo de emancipação, a ?saída da menoridade? a que aludia Kant, vem dar numa despersonalização das relações sociais, submetendo a vida humana à lógica impessoal de sistemas racionalizados, anónimos e administrativos, que retiram sentido à ideia de liberdade e autonomia individual. Esta imagem vai inspirar a chamada ?Escola de Frankfurt?. Horkheimer, Adorno e Marcuse consideraram que a história caminha, não no sentido das Luzes e da emancipação do homem, como diziam Hegel e Marx, mas sim no sentido de uma cada vez maior alienação, reificando progressivamente a consciência dos indivíduos submetidos à lógica do sistema: ?enquanto a história universal seguir o seu caminho lógico, jamais atingirá o seu destino humano?, escreve Horkheimer (1974, pág. 352). 4- A questão central no debate sobre a herança iluminista é a da legitimação dos argumentos em defesa da ?sociedade justa?, ou como foi dito por Foucault, ?O que é o Iluminismo?? numa época em que sucessivas catástrofes políticas revelaram o quociente de irracionalidade que pode acobertar-se sob o programa de emancipação e do progresso. A verdadeira critica do Iluminismo fora já antecipada nas obras de Nietzsche e Freud, quando colocaram em causa a unidade do sujeito e comprometeram, consequentemente, o sentido de uma política apostada em devolver o indivíduo a si mesmo. O problema tem suscitado vários desenvolvimentos que se posicionam, ora na sequência deste processo movido à razão, em particular à razão teorizada pelas Luzes, ora no pólo oposto, isto é, na tentativa de reactivar a filosofia setecentista. a) No primeiro pólo inscreve-se uma parte importante da filosofia francesa que se seguiu ao movimento estruturalista e que é animada por aquilo que vulgarmente se designa por desconstrução da modernidade. Michel Foucault, considerando a razão ocidental como o suporte de um discurso repressivo manipulado como instrumento de poder, e Lyotard, denunciando uma razão com pretensões a autolegitimar-se e a fundamentar racionalmente o totalitarismo, são os principais interlocutores deste tipo de pensamento. b) Do lado oposto situam-se as tentativas para reencontrar um consenso, uma base universalmente aceite, aonde escorar a legitimação dos valores e normas e tornar viável a fundamentação racional da lei. É esta reactivação do pensamento iluminista que prosseguem filósofos contemporâneos como Habermas ou John Rawls e, em certa medida, também Popper. Para Popper, o progresso é possível sem a afirmação de um critério último da verdade. A razão é essencialmente polémica, mas, exactamente por isso, exclui a hipótese de recurso à violência para resolver os conflitos e determinar a verdade ou a lei. Em ciência, isso significará a aceitação do risco de ver as teorias refutadas pela experiência; em política, significará o risco de cada um ver as suas propostas recusadas pelos outros, através da confrontação democrática de projectos. Para Habermas, herdeiro do pensamento de Frankfurt, há no fenómeno democrático uma racionalização do poder político, mas esta é ambivalente. Por um lado, significa a incorporação da razão instrumental, que visa a eficácia na gestão da economia e da sociedade; por outro, significa a incorporação da razão comunicacional na estrutura de poder, obrigando a que este legitime as suas decisões, por forma a suscitar uma adesão racionalmente motivada por parte daqueles a quem se destinam. Habermas sugere que o primeiro tipo de racionalidade tende a limitar o segundo, donde advém a cise de legitimidade contemporânea. Esta argumentação baseia-se no princípio iluminista de que a humanidade é permeável ao consenso e racionalmente motivável pelo melhor argumento; pressupõe também que a comunicação empírica esteja referenciada como uma situação ideal de fala, por uma instância onde se possa ancorar a universalização das normas, ou seja, a constituição de uma vontade geral pelo discurso.
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