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O Brasil na América


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O tema principal de Bomfim foi a formação e o desenvolvimento da nação brasileira, a necessidade e a possibilidade de superar a dominação colonial, no passado, e imperialista, no presente. Possibilidade sinalizada já no século XVII, diz em O Brasil na América, quando os brasileiros expulsaram os holandeses, vencendo "a potência mais poderosa do mundo de então". Prova, diz, da falência dos argumentos racistas que falam da incapacidade do Brasil e dos brasileiros superarem a dominação colonial e imperialista em virtude do clima, ou da indolência.

Parece, entretanto, que o autor não estava preocupado em demonstrar o nacionalismo como algo que emergia das tradições históricas e da paulatina descoberta do sentido da brasilidade pela incorporação da diversidade dos grupos étnicos culturais aqui estabelecidos. Um dos elementos sui generis apresentado pelo autor é o da incorporação daqueles que lutaram pela preservação do território como se esta luta garantisse legitimidade e unidade aos diferentes grupos. Outra exposição importante de Bomfim é a discussão bastante complexa que faz das noções de cultura, raça e alteridade. Para ele, nenhum dos grupos étnico- culturais que ocuparam o Brasil puderam preservar seus valores sem que eles sofressem profundas alterações. Deste modo, a idéia subjacente é a que há uma circularidade cultural independente da aceitação ou não desta objetividade.

Na década de 20, a oposição ao conceito de latino-americano se colocava para o autor, uma vez que essa unidade era entendida de modo preconceituoso especialmente pelos Estados Unidos, que atribuíam a todo o continente um estigma de atraso, inferioridade e alienação. Muitos intelectuais de renome aceitavam essa desqualificação e procuravam constituir fórmulas para o embate entre a civilização (Europa e Estados Unidos) e a barbárie. Deste modo, figuras como Oliveira Lima, Oliveira Vianna, Domingos Sarmiento ou Riva Arguedes desenvolveram tratados históricos ou projetos de desenvolvimento para superar os males de origem. A obra de Bomfim é escrita com o intuito de negar a homogeneidade que o conceito de América Latina apresentava e ao mesmo tempo procurar o lugar da nação nas singularidades encontradas.

De um lado, uma clara e firme posição antiimperialista e de outro a busca do Nacional como especificidade de um projeto incorporador, na medida em que a cultura singular de cada lugar ou região permitia a análise por um novo contributo ou entendimento do pertencimento e da memória. Deste modo, o regresso ao passado colonial é realizado com vistas ao encontro de formas de entendimento que pudessem responder, não a uma abstração idealizada do que significava cada um dos acontecimentos e as várias dimensões do conflito, mas aos resultados transformadores numa dialética de tempos desiguais e simultâneos em ação.

Assim, na primeira parte, "Origens", estão tecidos cinco capítulos que procuram reconstituir a epopéia do pioneirismo ibérico, as conquistas ultramarinas, as relações entre europeus e o gentio, o sentido menos destrutivo dos contatos, as alterações nos vários modos de vida, a formação da população brasileira com os elementos centrais da mestiçagem, o cruzamento das tradições e a gênese do sentido de inferioridade atribuído ao Brasil em decorrência do negro escravo. Na segunda parte, "O Primeiro Brasil", se encontram os seis capítulos nos quais o autor desenvolve sua tese central, ou seja, a nacionalidade foi sendo formada nas lutas pela preservação dos territórios e por meio delas se formaram o entendimento do Brasil e do ser brasileiro.

As lutas foram sendo incorporadas de modo muito especial por cada um dos grupos envolvidos, separando-se os elementos inassimiláveis, articulando localismos, regionalismos e mesmo o caudilhismo. Assim, aquilo que aparece como as longas durações históricas são poderosas forças de acomodação e particularidades, tecidas e criadas na superação do modo de vida anterior de cada grupo. Estes elementos se tornaram a tessitura da nova conformação social geradores do Estado Nacional. Deste modo, as comparações que Bomfim estabelece entre os processos que se desenvolvem nas colônias espanholas e as do Brasil são sempre linhagens de argumentação para demonstrar a formação brasileira em sua singularidade. Não há como atribuir a ele, contextualizando seu pensamento, um sentido hierarquizado ou mesmo uma centralidade fixa na conformação nacional apresentada.

O interessante é notar como Bomfim modifica o conceito de nacional comum entre seus interlocutores. Mais radical que seus contemporâneos, ele atribui valor às lutas concretas em defesa da territorialidade e considera serem agregadores os elementos constitutivos dessa ação.

O autor, no começo da obra, trata os portugueses como uma povo único, heróico e de origem celta, povo que, devido a particularidades históricas, faz a opção pela união e pela agregação que, mais tarde, tornou possível a existência de uma nação unificada. Em seu conceito, ?energias não podem ser destruídas, mas remodeladas? então, apesar de Portugal sofrer decadência, seu modo de pensar, suas energias foram transmutadas e são sentidas na sua colônia brasileira. Então a união do Brasil, diferente dos povos hispano-americanos, estaria em sua formação histórica, e não simplesmente no império brasileiro. Há no caráter do brasileiro uma formação multicultural que, apesar da predominância portuguesa, deve ao índio e  ao negro muito de sua formação e, embora a agregação em si fosse uma característica portuguesa, esses outros povos reconheciam a amizade e a importância de se trabalhar em conjunto. Embora outros povos, como os franceses e os holandeses, tenham freqüentado o Brasil, nenhum deles conseguiu esta harmonia necessária ao colonizador.


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