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Maria Antonieta


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& laquo;No leito conjugal, Luís XVI tem erecções muito condicionadas. Introduz o membro, por ali fica sem se mexer talvez dois minutos e retira-se sem nunca finalizar o acto. Depois diz: ?bonsoir Madame? e parece contente& raquo;. Quem assim descrevia o modestíssimo comportamento do rei de França era o enviado da sua apavorada sogra, admitido ao quarto e à cópula com a estrita missão de verificar as culpas. Sete anos de infertilidade punham a improvável aliança entre a Áustria e a França em risco. O relatório não aparece no soberbo filme de Sofia Coppola mas consta da soberba biografia de Antonia Fraser. A sogra era Maria Teresa, em cujos ombros recaíam a coroa húngara por herança e o trono do Sacro Império por casamento. A velha imperatriz já trouxera ao mundo nada menos do que dez arquiduquesas e quatro arquiduques quando ? entre dois despachos de Estado ? nasceu Maria Antónia. Péssimo augúrio ter visto a luz no dia de finados e mau presságio receber aquele nome que três vezes mudaria: a pequena e bela Maria Antónia seria Maria Antonieta por mania francesa e morreria só Antonieta, porque os revolucionários ? cela va sans dire ? odiavam a Virgem Maria. Fiel aos usos do tempo, Maria Teresa via na maternidade um ofício, em cada filha um tratado e em cada neto uma carta de conforto. Pois o neto francês é que não vinha. Maria Teresa admoestava a filha ? que fosse dócil, que fosse sedutora, que fizesse carícias e, sobretudo, que obrigasse o marido a dormir no «leito conjugal». Ora, na quitada tradição de Versalhes, o rei e a rainha podiam dormir em quartos separados, o que só prova que os costumes mais progressistas têm sempre um lado reaccionário. Resultado: Maria Antonieta acordava (quase) sempre sozinha. O problema estava no rapaz: em Luís XVI «a apatia é um estado natural», escreveu o cunhado; revela «uma imbecilidade inamovível», definia o primo que, aliás, era pior de carácter. O jovem Bourbon nada herdara do majestático Luís XIV nem do concupiscente Luís XV, seu avô. Só se interessava por caçar e era tão lúcido que, no dia em que o Antigo Regime caiu, anotou no seu diário ? «rien». Se no filme de Sofia Coppola há uma trama ? eu acho que há uma estética esfuziante, transbordante, total ? é a trama do casamento, não a da revolução. De resto, o ?povo? ? quer dizer, a parcela do povo que foi ao palácio ?, só dá entrada no filme ao minuto 101. Com o propósito de explicar que Maria Antonieta nunca disse aquilo dos brioches; o dislate é de uma infanta espanhola de outros tempos. E já que o filme tinha de acabar, então era melhor que o ?povo? acabasse com ele como acabou com a monarquia. Nada mais linear nos planos da filha de Coppola. Ela só queria fazer um filme sobre um mundo à parte ? Versalhes ? e sobre uma miúda no seu meio ? Maria Antonieta. Foi o que fez, sem vénia ao cinema comprometido. Viena era mais à frente mas não está lá. O que se vê é uma profusão infinita, não me lembro de outra igual, de bailes e máscaras e frescos e cómodas e dosséis, e vestidos e corpetes e lenços e sedas e sapatos, e champagnes e couverts e doces e chocolates e faisões e salmões. «Deus está nos detalhes», diria Lloyd Wright. Só gosta deste filme quem gosta de detalhes. A música é a poção mágica. Barroco com new wave, clássico mais new romantic. Vá lá alguém convencer aquela cabecinha de Robespierre que há em metade dos franceses a aceitar os New Order no Trianon, os Bow Wow Wow em Versalhes ou os The Cure não longe da Bastilha. Mas Sofia Coppola já tinha avisado nas Virgens Suicidas. Ela é som. Apupos, assobios (e alguns aplausos). Sofia devia estar alucinada quando pensou levar o filme a Cannes. Trop c?est trop. Até umas sapatilhas All Star aparecem. E logo a zombar da Revolução Francesa, cuja história oficial é sectária, xenófoba e, claro, bastante mentirosa. Nela, Maria Antonieta é a ?austríaca? (a estrangeira, portanto). Belzebu de saias, foi chamada detudo em panfletos anónimos: ladra, burra, ninfo, lésbica, tola, desalmada, sei lá que mais. Morreu guilhotinada depois de uma acusação monstruosa (incesto) e de um julgamento sumário (o advogado de defesa foi logo detido). Acontece ? nas revoluções. Já o insuspeito Eric Rohmer em A Inglesa e o Duque mostrou onde terminam as hordas em tumulto e as multidões em marcha. Terminam, invariavelmente, em novas tiranias e maiores terrores. Qualquer bom liberal ? qualquer bom conservador ? é um céptico sobre revoluções: deve evitá-las se puder, preveni-las se souber, contê-las se outro remédio não houver. Eu sou tão pouco revolucionário que nem sequer aprecio contra-revoluções. O filme poupa-nos esse debate, é pura obra. Kirsten Dunst é excelente enquanto Maria Antonieta. Sem enfado nem pretensão histórica, o filme aproxima-se mais da verdade. Ela era inconsciente da realidade? Claro, como qualquer miúda de 14 anos. Frívola? Nem mais nem menos do que qualquer delfina no seu meio. Gastadora? Também generosa. Infiel? Talvez, mas leal. E também era divertida, inteligente q.b. e ecológica, qualidades que manifestamente Luís não tinha. Mozart adorava-a e sonhou casar com ela.


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